Boa reflexão!
«“Arrisque-se!”, disse o mais impetuoso. “É isso: o que você tem a perder? Além do mais, olhe só o que você pode ganhar!”. Apontava o mais racional para a linda paisagem que se estendia frente àquele pico altíssimo, enquanto nosso amigo sentia suas pernas tremendo, o estômago se rebelando, as mãos suando, sentimento de luta ou fuga presentes; puro pavor em seu primeiro voo de asa delta.
Bem, essa estória se estende, e o resultado foi o entusiasmado relato de nosso amigo, após um ousado mergulho no desconhecido, adequadamente acompanhado pelo instrutor.
“Se valeu a pena?” Eis o início de longo e eufórico relato do aventureiro de primeira viagem.
Bem, não é exatamente sobre sua experiência que vamos tratar aqui, mas o que ficou bem delineado nas primeiras palavras.
Há situações que se apresentam como se um abismo se abrisse diante de nós, e, embora uma bela paisagem complete o quadro, o pavor do desconhecido acompanha a percepção do novo. Arriscar-se é algo muito útil, mas o risco – até onde podemos perceber bem – precisa ser um risco calculado, ou seja, submetido à apreciação responsável e sóbria. Contudo, cautela e controle não precisam coexistir. Cautela e prudência são muito úteis se irmanadas com a sensatez, porém, se convocam o desejo de garantias que é inerente à tentativa de controle, a espontaneidade que permite viver o novo, já se abre comprometida. Simples: como viver o novo filtrando cada movimento com velhos filtros, velhos conceitos? Será uma nova experiência gabaritada, percebida, julgada por velhos hábitos. Não será a autêntica ‘nova experiência, não é?
Abrir-se para o novo é parte da aventura de viver: requer audácia, intrepidez, ousadia, e concordamos que igualmente importante são a cautela, a prudência, a sobriedade e a responsabilidade, mas o novo – para ser novo – requer um salto no desconhecido. Se responsável, o salto não requer garantias e nem controle. É um salto espontâneo e por isso mesmo, predisposto, como área de contato, ao novo.
Buscar o conhecido no desconhecido é um modo de sabotar a própria aventura e reduzir muito as possibilidades de realização e de contentamento. E o frio na barriga, o tremor nas pernas, o suspense do próximo passo são parte da aventura de estar vivo; é natural sentir algum temor diante do desconhecido. Saltar no desconhecido com responsabilidade e ousadia não significa sentir as pernas firmes, significa sim, mergulhar no novo apesar das pernas trêmulas, sem necessidade de garantias. É o caminho do desbravador.
A respeito das questões “o que você tem a perder?” e “o que você pode ganhar?”, embora sejam questionamentos válidos e úteis em muitas situações, podem ser gradativamente deixados em segundo plano. A vida não diz respeito a ganhos e perdas. Isso parte das convenções sociais. É um modo de facilitar o entendimento do que é simples, mas o simples não precisa de entendimento.
Precisamos sim, sentir o Simples, viver o Simples, não entendê-lo.
Muitos chegam à conclusão que tempo de mais é consumido na tentativa de entender a vida, ao invés de vivê-la. Os mais sábios sempre nos alertam a respeito. Por isso, não se trata do que pode ganhar-se e do que pode perder-se. A experiência é parte da aventura maravilhosa que é viver, e já representa o ganho por sua própria natureza.
Desse modo, nossa motivação para vivermos cada momento não é o ganho de algo ou a prevenção da perda de algo; a nossa motivação é o viver a vida em sua totalidade.
Eis as dicas: de um lado ousadia, audácia e coragem e de outro a cautela, prudência e sensatez, tudo bem temperado com responsabilidade e sobriedade.
Essa receita já incorporada à estrutura psicológica fortalece a integridade da percepção do Novo, e a atitude espontânea para viver cada maravilhoso momento da vida se faz realizável. É o simples sentir a oportunidade de viver cada momento único.
A vida, a gente faz acontecer, enquanto em si própria ela acontece para toda a gente.»
Aloha
Claudia Michepud Rizzo